Humulus lupulus lupulus |
Outra grande peça na fabricação de uma Charles Brenson Bier, e de qualquer outra cerveja, é o que chamamos de lúpulo. O lúpulo é uma éspecie de trepadeira originária da Europa e da Ásia, da espécie Humulus lupulus, da família Cannabaceae. Para aqueles que ainda não sabiam, estas flores verdes aí em cima são sim primas da maconha! Ele é utilizado amplamente na produção de cerveja, além de poder ser utilizado como condimento para cozinha e também é utilizado alternativamente como fármaco na medicina, por suas características relaxantes (um ótimo calmante!).
Mas por que adicionar este ingrediente na nossa cerveja? Por que deixa-la com certo amargor e aroma?
Antigamente, a cerveja era preparada com diversos tipos de especiarias, para lhe dar sabores os mais variados possíveis, enriquecendo-a ao lhe adicionar aromas, dar-lhe mais cor, aumentar o seu teor alcoólico. Utilizavam coentro, mel, açúcar mascavo, anis, gengibre, rúcula, alecrim, cravo e raízes em geral. A partir do século VIII padronizou-se pela europa a formulação de uma mistura de ervas chamada gruit, que consistia de alecrim, artemísia, aquiléa, uze e gengibre para aromatizar a cerveja.
Relata a história que a primeira vez que o lúpulo foi utilizado na cerveja data do século IX. O primeiro registro escrito porém, data da Idade Média e se refere a monja alemã Hidelgarda von Bigen (1098-1179) que acidentalmente deixou cair folhas e flores desta trepadeira em uma tina de mostura de cerveja. Ao pensar que a produção estava perdida, perecebeu porém que o lúpulo tinha conferido uma conservação nunca antes vista naquela época.
Hidelgard Von Bingen (1098-1179) |
Hidelgarda escreveu então em seu livro Physica sive Subtilitatum a seguinte frase: "Quando colocado na cerveja, o lúpulo impede a putrefação, e garante durabilidade longa". Por muitos ela é considerada Santa, apesar de nunca ter sido canonizada.
Devido a esta especial característica do lúpulo, de conservante natural da cerveja, ele foi cada vez mais sendo utilizado na produção pela Europa. Apesar da relutância contra o gosto amargo, após alguns anos os consumidores foram se acostumando ao amargor, além do efeito relaxante das suas substâncias. Por volta de 1400 o lúpulo já era bastante difundido por todo o velho continente e se manteve até os dias de hoje.
O lúpulo é uma planta trepadeira nativa de regiões temperadas do norte, e crescem em latitudes entre 35° e 55°, tanto no hemisfério norte quanto no sul. Ela precisa de longos períodos de frio intenso e escuridão no inverno, onde passam por um processo de dormência, além de sol abundante durante o verão para o seu crescimento. Necessita então de dias e noites longas durante o ciclo anual.
Produção de lúpulo no mundo, em regiões temperadas ao Norte. A produção no hemisfério Sul é muito pouca, ocorrendo em parte na Austrália |
O lúpulo tem uma trepadeira macho e outra fêmea. São as flores das fêmeas em forma de cones que são utilizados para a extração dos alfa-ácidos, unidades que garantem o amargor característico deste ingrediente. Conferem também aromas e sabores variados, dependendo do tipo de lúpulo utilizado.
Diversas técnicas permitiram que se manipulasse as "raças" de lúpulo através de cruzamentos entre diferentes variedades e seleção dos resultados. Um lúpulo selvagem nativo da europa por exemplo é diferente de um encontrado nos EUA que por sua vez é diferente de um asiático. Eles são porém ferteis entre si, podendo gerar combinações entre seus estilos. Com modernas técnicas de bioengenharia pode-se padronizar os diferentes tipos de lúpulo em relação ao seu aroma e amargor.
Plantação de lúpulo na região de Hallertau, na Alemanha. |
Por ser uma trepadeira, é necessária para produção em grande escala grandes armações de até cinco metros de altura ou mais, onde fios são erguidos para que a trepadeira se oriente e desenvolva para cima. Após adulta, e essas plantinhas crescem rápido, elas entram na fase de reprodução e as flores começam a brotar. Caso haja a presença da planta macho, ocorre a fertilização e formação de sementes e o ciclo se reinicia.
Fazenda de lúpulo |
Armações para crescimento do lúpulo |
As flores são separadas dos caules e folhas e então secas em estufas e processadas para as cervejarias ou em nosso caso, cervejeiros artesanais. Podem ser comercializadas em forma de flor ou em pellets, que nada mais é que a flor compactada e transformada em pequenos cilindros pela facilidade de transporte.
Colheita |
Lúpulo pelletizado |
Caso alguém se interesse mais sobre a produção, colheita e processamento do lúpulo, assista este vídeo, interessantíssimo, por sinal! Este é um vídeo de um conjunto de 24 famílias produtoras de lúpulo nos Estados Unidos: http://www.oregonhops.org/
Infelizmente a produção de lúpulo no Brasil não é viável, pois estamos em uma latitude muito alta e as plantas não chegam a florescer, segundo relatos de muitos cervejeiros artesanais que aqui tentaram as suas produções de quintal (eu inclusive queria tentar aqui em Curitiba!) relataram que não conseguiam flores ou quando conseguiam eram muito poucas.
Amargor e aroma
O lúpulo possui dois tipos de resinas principais, os alfa e beta ácidos. Os alfa ácidos (AA) possuem um efeito antibiótico e bacteriostático contra bactérias gram positivas, e favorecem o crescimento da levedura durante a fermentação do mosto. Além disso, eles garantem a cerveja o amargor característico que todos conhecemos. Quanto maior a concentração de AA no lúpulo, mais amarga ficará a cerveja. Lúpulos com grandes quantidades de AA são chamados de lupulo de amargor (bittering hops).
Estas resinas precisam para ser "isomerizadas" um longo período de fervura durante a produção da cerveja. Usualmente para extrair o todo o amargor de um lúpulo se necessita entre 60 a 90 minutos de fervura intensa. Ocorre também a liberação de aromáticos, que devem evaporar durante esta fervura pois deixariam um gosto ruim na cerveja.
Os Béta Acidos (BA) por sua vez não isomerizam durante a fervura do mosto. Eles contribuem para o aroma e lúpulos com grande quantidade de BA são chamados de aromáticos. Estes lúpulos aromáticos são adicionados no final da fervura, e ficam menos de 10 minutos em contato com o mosto fervente. Desta forma, os AA que ali estão presentes não isomerizam por completo auxiliando no aroma final da cerveja.
Adição de lúpulo à fervura |
Simplificando, ao fazer uma cerveja você deve escolher seus lúpulos de amargor, que ferverão por cerca de uma hora, e de aroma, que serão adicionados no final do processo. Pode-se ainda fazer o "dry-hopping", que é a adição de lúpulo diretamente na cerveja em fermentação, para garantir um aroma ainda mais característico.
International Bitterness Unit
Esta sigla aí em cima significa unidade internacional de amargor, em ingrêis. Foi criada para padronização do amargor presente nas cervejas mundo afora. Assim como existe uma escala para cores da cerveja, comentado no último post sobre maltes, aqui existe uma escala para o quão amargo é esta bera.
1 IBU significa 1 miligrama de alfa acidos isomerizados em 1 litro de mosto pronto. Quanto maior o IBU, mais amarga é a cerveja, e vice versa. Este fator pode ser na verdade mascarado, pois uma cerveja mais maltada com 50 IBU´s será percebida como menos amarga que uma Pale Ale com os mesmos 50 IBU´s, pois o gosto maltado balanceia o amargor.
O IBU é calculado a partir da quantidade de lúpulo adicionado, da quantidade de álfa ácidos deste lúpulo e de quanto tempo ele ficar fervendo.
Quanto maior a quantidade, o índice de AA e o tempo de fervura, maior será o IBU. Uma cerveja destas industriais brasileiras, possui um índice de IBU que chega no máximo a 5. Uma Irish Red Ale, a minha última produção, teve 25 IBU´s. Uma India Pale Ale, um estilo de cerveja muito lupulada possui entre 40 a 70 IBU´s. Veja a tabela abaixo para ver a quantidade de IBU em cada estilo de cerveja!
Por fim, gostaria apenas de falar da imensidão de quantidades de lúpulo que encontramos hoje no mercado. O link abaixo mostra as descrições de vários tipos de lúpulo, apenas para você ter idéia de quantos tipos são. O que significa isto? Milhares de possibilidades de receitas, pois mudando um lúpulo de aroma, você pode ter duas cervejas diferentes!
É isso aí, caso tenha faltado algo durante a semana eu completo o post!
Espero que tenham gostado deste tópico! Em breve falarei um pouco sobre a água e os fermentos!
Um abraço!
Bruno
Grande Bruno, nos presenteando com mais uma postagem muito interessante e altamente instrutiva! Mais uma vez, parabéns pela iniciativa. Esse material do LAMAS eu já lí, achei muito interessante. Quanto à chopeira, espero que sirva também. Você já pensou em fazer aquela com uma caixa térmica? Parecem bem legais. Se essa que eu comprei não servir, farei uma daquelas. Abraço.
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